Polícia Civil indicia 11 pessoas da cervejaria após intoxicação por dietilenoglicol

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Inquérito foi finalizado com 29 vítimas. Sete delas morreram.

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Onze pessoas são indiciadas por homicídio, intoxicação e lesão corporal no caso da Backer

Onze pessoas são indiciadas por homicídio, intoxicação e lesão corporal no caso da Backer

Onze funcionários da cervejaria Backer foram indiciadas pela Polícia Civil de Minas Gerais após a intoxicação por dietilenoglicol em cervejas da marca. Entre os crimes, estão lesão corporal, contaminação de produto alimentício e homicídio.

Segundo o delegado Flávio Grossi, a Polícia Civil conseguiu comprovar, física e quimicamente, a existência de um vazamento no tanque de cerveja. As investigações comprovaram que o vazamento começou em setembro de 2019, quando foi adquirido o tanque JB10, que foi onde a polícia concentrou seus esforços, por ter demonstrado quimicamente alta concentração da substância.

“Encontramos o vazamento dentro do tanque. O líquido ia para dentro da cerveja. Achamos a comprovação física e visual da existência desse vazamento, mas, para nossa equipe, queríamos mais. Demonstramos quimicamente uma similaridade entre o produto retirado no tanque e lá dentro do produto. Tinha a mesma composição. Comprovamos de forma química a existência desse vazamento”, disse Grossi.

Ele também disse que foram encontrados outros pontos de vazamento na mesma adega. Um deles, na bomba do chiller, o resfriador dos líquidos. “A bomba do chiller vazando, o líquido se espalhava pela fábrica”.

Backer: animação mostra como aconteceu contaminação de cerveja

Backer: animação mostra como aconteceu contaminação de cerveja

Fazem parte do grupo de indiciados:

  • Testemunha que mentiu em seu depoimento (responderá por falso testemunho e obstrução)
  • Chefe da manutenção (responderá por homicídio culposo, lesão corporal culposa e contaminação de produto alimentício culposa)
  • Seis pessoas do grupo gestor e responsáveis técnicos (responderão por homicídio culposo, lesão corporal culposa e contaminação de produto alimentício dolosa)
  • Três pessoas do grupo societário (responderão de forma dolosa por não dar publicidade a produto que causa risco e por manter em depósito e colocar à venda esse produto)
Caso Backer: Polícia Civil conclui inquérito — Foto: Fernando Zuba/Globo

Caso Backer: Polícia Civil conclui inquérito — Foto: Fernando Zuba/Globo

“Esta investigação foi multifacetada, tivemos químicos, engenheiros, peritos da maior gama possível. Atuamos de forma extremamente centrada e, para iniciar a investigação, precisávamos entender como é feita a cerveja”, disse Grossi.

O inquérito, que chegou a considerar 42 vítimas, foi concluído com 29 vítimas criminais, segundo a Polícia Civil. Sete morreram e 22 sobreviveram. “No decorrer das investigações, retiramos dez vítimas por fatores investigativos ou médicos. Ou laudo descartava ou deixava em dúvida. Três vítimas não desejaram fazer testes de exames”, explicou.

Ele esclarece que outros 30 casos ainda serão analisados. De acordo com o delegado, se essas eventuais vítimas fossem anexadas às investigações neste momento, a solução do inquérito poderia ser adiada. “Essas pessoas não serão abandonadas”.

Uso de produtos tóxicos

De acordo com o delegado, em nenhum momento, os técnicos da cervejaria atuaram com dolo. “Foi um fato acidental, sem sombra de dúvida, mas passível de punição”, afirmou. Segundo ele, foram identificadas duas modalidades da culpa: negligência e imperícia.

Ele frisou que duas condutas levaram às intoxicações e mortes: o uso incorreto do equipamento, com substância tóxica, e o descontrole (vazamento) dessa substância. “Se tivessem interrompido qualquer uma dessas duas condutas, nada disso aconteceria”, disse o delegado.

“O tanque exigia consumo de substância não tóxica e era usada substância tóxica. Chiller indicava também uso de substância não tóxica. Essas substâncias (não tóxicas) poderiam circular e, mesmo vazando, não haveria efeito danoso às vítimas. Não causariam nenhuma letalidade ou lesão às vítimas. Se os manuais dos fabricantes fossem seguidos, não estaríamos aqui. No máximo ocorreria diferença de sabor ou aumento de teor alcoólico. Se o álcool tivesse sido usado (em vez de dietilenoglicol), nós não estaríamos aqui hoje”, disse Grossi.

O superintendente de Polícia Técnico-Científica, Thales Bittencourt, explicou que tanto o monoetilenoglicol quanto o dietilenoglicol são tóxicos e causam a síndrome nefroneural, com pequena diferença nos sintomas.

Mas as necropsias feitas em vítimas que perderam a vida constataram que a contaminação foi por dietilenoglicol:

“Em todas elas foram constatadas alterações macro e microscópicas compatíveis com contaminação por dietilenoglicol. E em todas também foi constatada a presença do tóxico dietilenoglicol. Cem por cento de produtividade nas necropsias”, afirmou.

A forma como esse produto tóxico era adquirida pela Backer será alvo de uma segunda investigação, mas, segundo o delegado Flávio Grossi, ela não interfere na conclusão deste inquérito, que já constatou que o dietilenoglicol foi usado indevidamente e que houve vazamento dele para as cervejas que depois foram consumidas pelas vítimas.

Conforme os delegados, os laudos de todas as perícias feitas ao longo das investigações já foram entregues à Justiça, e agora o Ministério Público vai analisar as medidas que julgar cabíveis.

A Backer informou que “reafirma que irá honrar com todas as suas responsabilidades junto à Justiça, às vítimas e aos consumidores. Sobre o inquérito policial, tão logo os advogados analisarem o relatório, a empresa se posicionará publicamente”.

Dietilenoglicol foi encontrado em cervejas da Backer — Foto: Danilo Girundi/TV Globo

Dietilenoglicol foi encontrado em cervejas da Backer — Foto: Danilo Girundi/TV Globo

Vítimas dizem que ainda estão desamparadas

Após a apresentação pela Polícia Civil de sua conclusão do inquérito, as vítimas do caso Backer se manifestaram por meio de nota enviada à imprensa que que dizem que “mais de 30 famílias continuam desamparadas, sem qualquer auxílio ou apoio da cervejaria Backer”.

Leia na íntegra:

“Antes de tudo, é preciso informar que a responsabilidade civil da Backer diante das vítimas é objetiva, não sendo necessário comprovar a culpa pelo ocorrido. A conclusão do inquérito além de reforçar a responsabilidade da cervejaria, demonstra de maneira inequívoca a culpa e o dolo dos gestores da cervejaria Backer pela tragédia que envenenou pelo menos 30 (trinta) pessoas. São mais de 30 (trinta) famílias severamente atingidas: ver seus queridos internados em CTI, com perda de movimentos e visão, dificuldade de fala, comprometimento dos rins, com sequelas que jamais serão reparadas. Além disso, diante das pelo menos 7 (sete) mortes, outras famílias jamais poderão conviver novamente com seus amados, MORTOS PELO SIMPLES CONSUMO DE CERVEJA BACKER.

Enquanto isso, as mais de 30 (trinta) famílias continuam desamparadas, sem qualquer auxílio ou apoio da cervejaria Backer, que de maneira reiterada não cumpre com as determinações judiciais, encontrando os mais variados tipos de desculpas para se omitir de suas responsabilidades. As evidências de desvio patrimonial e alteração de sócios em empresas do grupo comprovam o intuito de fraudar e se esconder das indenizações devidas às vítimas. Além dos danos às pessoas, as famílias estão arcando com os tratamentos caros, perderam renda e estão completamente desamparadas, sem qualquer auxílio frente a tantas dificuldades. TUDO ISSO, POR CONTA DA BACKER.

A conclusão do inquérito demonstra o completo descontrole da Backer diante dos produtos oferecidos à população, manchando a imagem de Minas Gerais e principalmente do setor cervejeiro-artesenal. O que se espera é justiça para as vítimas, suas famílias e toda a sociedade mineira. Não existem mais desculpas para que a Backer deixe de prestar auxílio aos envenenados!”

Relembre o caso Backer

As investigações sobre o caso Backer começaram no dia 8 de janeiro deste ano, com a abertura do inquérito, que foi concluído nesta segunda-feira (8). Ao longo de cinco meses de apurações, a Polícia Civil identificou 29 vítimas de contaminação por dietilenoglicol. Sete delas morreram.

Polícia Civil conclui inquérito que investiga contaminação de cerveja da Backer

Polícia Civil conclui inquérito que investiga contaminação de cerveja da Backer

Ao todo, o inquérito reúne mais de 4 mil páginas e ouviu mais de 70 pessoas, dentre elas, vítimas sobreviventes, suspeitos e testemunhas.

Os trabalhos foram coordenados pela 4ª Delegacia de Polícia Civil Barreiro. Esses cinco meses de investigações foram marcados pela luta das vítimas por recuperação e cobrança de direitos pelas famílias dos intoxicados pelo dietilenoglicol. Dos 22 sobreviventes, apenas um chegou a receber auxílio da cervejaria para o tratamento de saúde.

Os pacientes contaminados pela substância desenvolveram sintomas que se iniciavam com náusea, vômito e dor abdominal, que evoluíam para insuficiência renal e alterações neurológicas.

Cristiano Mauro Assis Gomes relata recuperação. À esquerda, foto tirada em 11 de abril; à direita, registro feito em 2 de maio — Foto: Cristiano Mauro Assis Gomes/Arquivo Pessoal

Cristiano Mauro Assis Gomes relata recuperação. À esquerda, foto tirada em 11 de abril; à direita, registro feito em 2 de maio — Foto: Cristiano Mauro Assis Gomes/Arquivo Pessoal

O que é o dietilenoglicol?

O dietilenoglicol (DEG) é uma substância de cor clara, viscosa, não tem cheiro e tem um gosto adocicado. A fórmula química é C4H10O3. Ela é anticongelante e de uso bastante comum na indústria.

A ingestão pode provocar intoxicação com sintomas como insuficiência renal e problemas neurológicos.

Segundo a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), a substância é um solvente orgânico altamente tóxico que causa insuficiência renal e hepática, podendo inclusive levar a morte quando ingerido.

A intoxicação por DEG pode ocorrer quando ele é usado de forma inapropriada em preparações químicas, substituindo outros produtos não tóxicos para o ser humano. Desde 1937, foram registradas dezenas de casos de intoxicação em diferentes países.

Via G1

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